"Transformação Digital não é sobre tecnologia; é sobre pessoas".
Esse é a frase da minha palestra sobre Transformação Digital que, ultimamente, mais tem deixado as pessoas boquiabertas. Quando o slide aparece com ela, a audiência logo pega no celular e tira fotos. Afinal, é uma informação que querem guardar, e muito bem guardado.
O furor tem explicação – e ela, geralmente, vem em forma da pergunta: "como assim, não tem a ver com tecnologia? Sempre achei que transformação digital era só tecnologia... que história é essa?"
Compreendo a reação, já que, nos últimos anos, a maior parte das transformações nas ferramentas de trabalho, na rotina pessoal e no modo como nos relacionamos com as pessoas tem o dedo da tecnologia. Mas, vale sempre lembrar, para a transformação digital nas empresas, a tecnologia é apenas um meio, e não o fim.
O coração da transformação está no ser humano, em sua própria transformação individual, a partir do desenvolvimento de competências e habilidades que proporcionam, ou facilitam, as adaptações dentro da empresa.
Dessa forma, acreditar que uma organização está promovendo transformação digital apenas quando contrata a melhor ferramenta de CRM, ou lança um aplicativo, ou, até mesmo, inicia um ponto de vendas online, é ilusório.
Todas essas alternativas podem ser importantes ao desenvolvimento da empresa em seu mercado e no relacionamento com o público, mas nenhuma delas vai funcionar se o fator humano não for levado em consideração. Reside justamente nesse contexto o primeiro erro dos empreendimentos que querem fazer parte da Revolução Industrial 4.0.
E, infelizmente, ele é só o começo.
Sinais de que sua empresa entendeu tudo errado
O conceito de transformação digital pode, e deve, ser trabalhado em todas as organizações, independentemente de seu porte ou nicho de mercado. Sem essa consciência, muitas vantagens competitivas – como ser uma empresa de tradição, conhecida, com muitos anos de atividade – ficam pelo caminho.
A razão é simples: a Revolução Industrial 4.0 responde à demanda de respostas rápidas para um público que tem pressa de tomar decisões. Portanto, as ferramentas que facilitam essa interação são bem-vindas; mas, sozinhas, elas não vão fazer milagre.
Por isso, acredito que muita gente pode se surpreender com o conteúdo que mostro abaixo. Gestores de todos os níveis estão acostumados a receber informações sobre novas ferramentas digitais, que viabilizam inúmeras tarefas, mas ainda não estão inteiramente por dentro da importância do fator humano para a implementação das novidades.
Separei os três principais sinais de que, na minha opinião, a sua empresa pode estar indo justamente por esse caminho: investindo em ferramentas espetaculares que, sem o cuidado com as pessoas que as operam, não vão dar retorno algum.
Sinal 1: Investe-se muito em ferramenta e pouco no conhecimento
Já que toquei na ferida, vamos a ela: vi muitas empresas com budget milionário, como a L’Oreal, investir pesado em ferramentas e softwares para Tecnologia da Informação. Isso é excelente; uma multinacional precisa ter esse domínio dentro da transformação digital.
Contudo, a mesma empresa apresentava um orçamento muito baixo para o treinamento de pessoal nas questões digitais.
Ora, comprar o “equipamento” e não ensinar as pessoas a usá-lo é tão ineficiente quanto não ter o equipamento em questão. Imagine, por exemplo, um hospital que adquire um excelente aparato tecnológico para seu centro de neurocirurgia, mas o coloca nas mãos de novatos estudantes de medicina.
De onde eu venho isso tem um nome. Chama-se “jogar dinheiro fora”.
Assim, o primeiro sinal de que a empresa entendeu errado o conceito de transformação digital nasce dessa visão equivocada de para onde direcionar os investimentos. Na maioria dos cenários eles são desproporcionais, quando levamos em consideração o que se gasta com ferramentas e o quanto não se aproveita o momento para o treinamento digital dos times.
E, aqui, estamos falando de todos os times de uma empresa, não apenas os de marketing e/ou canais digitais. Se a equipe de uma empresa não tiver o conhecimento adequado para operar as ferramentas digitais, não há TI que resolva os gargalos corporativos.
Sinal 2: Desconexão entre área de inovação e atividade-fim
Sunil Gupta, professor de Harvard e autor do livro Driving Digital Strategy, diz que não adianta dar autonomia a laboratórios de inovação e transformação digital nas empresas se, no fundo, elas estão separadas do negócio em sua atividade-fim.
Para ele, e eu concordo, sem a conexão entre inovação e core business é possível que a empresa invista em uma série de experimentos que raramente vão dar o retorno esperado em impacto no lucro da empresa.
Portanto, é indispensável que as estratégias de transformação digital nas empresas façam parte da rotina de todos os times, e até recomendo que estejam fisicamente próximas! Só assim as pessoas vão ver propósito, necessidade e urgência em adaptar seus setores ao que a organização pretende fazer. De frequente vejo empresas montando laboratórios de inovação totalmente desconectados do resto do negócio, ao ponto que os times parecem falar até “diferentes idiomas”...
Sinal 3: Enxerga-se a transformação digital nas empresas como redução de custos
É claro que algumas (senão todas) ferramentas de automação podem mostrar uma significativa redução de custos no quadro geral das empresas. Isso ocorre porque, em boa parte das vezes, o gestor enxerga a ferramenta como uma forma de reduzir o custo de mão de obra humana.
Contudo, preste bem atenção, pois isso é muito importante: enxergar o digital como forma de abrir mão da expertise humana é uma forma erradíssima de olhar para o cenário de transformação. Se tiramos o lado humano das organizações, estamos tornando a operação em um processo frio e calculista.
Em um primeiro momento, isso pode “aliviar” as contas; mas, no longo prazo, o cenário não se vende. Afinal, até o tomador de decisões pode, no futuro, ser substituído por uma máquina...
Passando os sinais a limpo
Se sua empresa apresenta a visão descrita acima, tenho uma boa e uma má notícia. A boa é que ainda está em tempo de mudar essa maneira de tratar a transformação digital e se adequar aos desafios que ela proporciona. A má é que ignorar essa realidade pode tirar a organização do mercado: os executivos da Blockbuster, entre outras empresas, podem nos confirmar.
A primeira maneira de passar esses sinais a limpo é olhando para as necessidades do seu pessoal, sejam elas voltadas ao treinamento para utilização de novas soluções, sejam as que as pessoas têm a partir de suas expectativas pessoais – como, por exemplo, se sentir bem em uma atividade, sabendo que seu esforço é direcionado a um propósito.
Sem a preocupação em dar ao ser humano o que ele precisa para fazer seu trabalho da melhor forma possível, é impensável esperar bons resultados. Não espero, com isso, fazê-lo entender que a inteligência artificial não é o futuro – ela apenas não é, hoje, o suficiente. Ao final em todos casos há alguém por trás da máquina, fazendo análises, tirando conclusões e propondo novas estratégias: estava recentemente lendo um especial do New York Times sobre Inteligência Artificial, e um artigo do Cade Metz do título “Machine Learning Takes Many Human Teachers” (ou seja, o Machine Learning Precisa de Muitos Professores Humanos) aponta ao fato que atrás de cada Inteligência Artificial, tem o fator (e a influência, inclusive!) humana: são enormes times de pessoas que tem que categorizar os dados necessários para alimentar as máquinas. IQ + AI= Inteligência ao Cubo?
É aí que eu te pergunto: sua empresa está respondendo aos sinais errados ou fazendo o certo para se manter competitiva e, principalmente, atualizada com as questões da transformação digital?
Pense bastante antes de dar sua resposta – e, quando a tiver, vamos continuar o papo aqui nos comentários.