Recentemente tive uma reunião com o responsável da área de treinamento e Desenvolvimento de vendas de uma das maiores empresas de beleza do mundo, que trabalha com milhões de revendedoras de seus produtos. Ele me fez uma pergunta, que custei a responder inicialmente: “Como podemos usar a IA para melhor educar nossas revendedoras?”. Nós falamos das ideias mais óbvias, como de ter um chatbot interagindo com elas, mas confesso que não fiquei totalmente satisfeito com minha resposta.
Fiquei refletindo sobre isso depois da reunião e fiquei pasmo pela quantidade de oportunidades de aplicação de uso da IA na aprendizagem, particularmente na parte da personalização da jornada educacional. Nós iremos falar disso tudo neste artigo, mas aproveito para dar um pequeno spoiler: usando IA generativa, é possível criar um volume muito maior de novo conteúdo. Conteúdo este, que vai alimentar trilhas personalizadas de aprendizagem através de algoritmos de recomendação.
Vamos começar ouvindo uma frase do Richard Uchoa Vasconcellos, fundador e CEO da Revvo, empresa de aprendizagem digital humanizada e focada em resultados onde eu sou criador de cursos também. Recentemente eu e o Richard fizemos uma live sobre o impacto da IA no mundo da educação corporativa, e ele comentou o seguinte. Ouça só:
"Durante a pandemia, aumentamos em 3 vezes o número de reuniões virtuais. As pessoas passam 57% do seu tempo diário em comunicação, seja em reuniões, e-mails, Zoom e várias ferramentas de comunicação, em vez de criar ativamente com Word e PowerPoint. Portanto, a Microsoft está apostando que a inteligência artificial (IA) reduzirá significativamente esse tipo de trabalho. A ideia é automatizar tarefas, aumentar a produtividade e permitir que a IA resuma informações, liberando tempo na agenda. Ferramentas como o Co-Pilot da Microsoft estão disponíveis no Word, onde você pode fornecer prompts, e a IA auxiliará na criação do trabalho. Nos próximos 3 anos, o modelo de trabalho será radicalmente transformado."
Para começar nossa discussão sobre a aplicabilidade da IA em programas de T & D, vamos dar um passo para trás e nos perguntar: por que existem equipes de aprendizado e desenvolvimento? O que estamos trabalhando para alcançar em nossas organizações? Estamos aqui para garantir que as pessoas estejam prontas para atuar, melhorar ao longo do tempo no cumprimento dos requisitos de sua função e ter as habilidades certas para atuar de maneiras novas e eficazes no futuro. Então, em vez de pensar em como criar um curso mais rápido, que tal aplicarmos nossa atenção e energia para integrar a IA generativa para atender a esses objetivos da maneira mais direta e eficiente possível? Na verdade, e se não fossem necessários cursos para isso?
As pessoas podem se perguntar se a adoção de tecnologias de IA generativas para desenhar cursos de L & D mais amplos é melhor do que um indivíduo usar as mesmas ferramentas para atender suas necessidades de aprendizagem mais específicas. A resposta curta é que as equipes de L&D simplesmente não conseguem ser tão granulares, ou seja, tão específicas e assertivas. Então, ficaríamos sem trabalho presumindo que nossos cursos genéricos e de amplo apelo serão mais úteis - ou de alguma utilidade - em comparação com as mesmas ferramentas nas mãos daqueles que estão mais próximos de suas necessidades personalizadas?
Qual é a solução aqui?
Um dos elementos mais empolgantes da IA generativa é sua capacidade de usar os dados aos quais tenha acesso. Isso será extremamente valioso para L&D (e organizações em geral) ao buscar entender mais sobre suas equipes e eventuais problemas de desempenho e capacidade. Por exemplo, onde a organização está perdendo bons profissionais? Onde há uma dependência excessiva de contratações externas? Poderia haver um canal para o talento passar para funções cruciais?
Visto por essa lente, fica claro que a utilidade da IA generativa para as equipes de L&D não é criar produtos educacionais abrangentes para atender às necessidades presumidas. Afinal, nosso papel é destacar pontos críticos de falha onde podemos aplicar nossos recursos para fazer uma diferença significativa. Portanto, ao combinar IA com dados relevantes, recentes e agora acessíveis instantaneamente, podemos ser muito mais poderosos ao atender às necessidades reais que estão causando atrito em nossas organizações e funcionários.
Uma vez que as equipes de L&D estejam munidas de informações, elas podem recrutar especialistas no assunto para corrigir e contextualizar os recursos generativos criados por IA para atender às necessidades específicas. Isso é ótimo porque uma das tarefas mais impossíveis que pedimos às PMEs é descompactar tudo o que sabem ao concluir uma tarefa ou fazer as coisas certas. Mas é sempre mais fácil refinar o rascunho de outra pessoa do que começar do zero.
Com tudo isso em mãos, podemos fornecer recursos altamente específicos para aqueles que precisam deles em pouco tempo. Por exemplo, em vez de um curso de 20 minutos, podemos fornecer apenas algumas frases de orientação que podem ser acessadas durante uma breve pausa no trabalho e aplicadas imediatamente. Não se trata de criar cursos mais rápidos; se trata de resolver problemas da maneira mais eficiente possível.
Isso nos leva ao conceito de Microlearning, que é um dos grandes temas na área de T&D hoje em dia. A IA generativa seria capaz de criar pílulas personalizadas e com uma granularidade altíssima, que possam ser mais relevantes para quem as ouve. Vou fazer um exemplo prático: hoje eu tenho um Podcast de T & D para a área de Conteúdo da Globo, onde já aplico microlearning através de podcasts semanais sobre Liderança bem curtinhos. Porém, quem trabalha na área de entretenimento vai receber o mesmo conteúdo que quem trabalha na área de dramaturgia, mas talvez seus desafios de negócio sejam muito diferentes. Meu curso de liderança disponível na Revvo é igual para profissionais da área de saúde e os de Pharma, mas mesmo que as áreas sejam semelhantes, o mix de cases é o mesmo porque eu não tenho braço para poder fazer infinitos exemplos customizados. Uma vez recebi uma demanda de customizar o meu curso de liderança para uma das maiores empresas de proteína animal do mundo, onde demorei meses na roteirização porque para fazer exemplos assertivos, tive que estudar muito sobre esse mercado.
Bom, a IA Generativa veio para resolver tudo isso: ela conseguiria criar conteúdo com uma granularidade infinita, tornando ele mais relevante, e fazendo isso em tempo real.
A partir dessa maior granularidade de conteúdo, o passo seguinte em que a IA pode ajudar é a parte de recomendação de conteúdo: seja via chatbot ou menos, o conceito é que a IA será quem irá recomendar esses conteúdos baseado nos seu perfil, no seu histórico, no seu momento. Vamos fazer o exemplo da University of Phoenix: Marc Booker, PhD, Vice-Reitor de Estratégia na Universidade de Phoenix, disse em uma entrevista que “Na Universidade de Phoenix, vemos a IA como qualquer outra nova ferramenta que tenha entrado na arena do aprendizado e que melhore o acesso do aluno a dados e informações para processar e adquirir conhecimento mais rapidamente. Quer seja a internet, a calculadora ou mesmo a imprensa - todos entraram na consciência social como disruptores com alguma cautela e ceticismo, mas foram usados para mudar a rapidez com que podemos aprender e compartilhar informações para aumentar a profundidade das informações que passamos para as gerações futuras. É preciso ter cuidado em seu uso e administração, mas definitivamente não temer, pois tem o potencial de fazer um grande bem no campo da educação prática a distância e aprendizado online.”
A verdade é que a IA atual como ferramenta e modelo linguístico pode realmente ajudar os designers de aprendizagem a aprimorar o enquadramento em torno do tom e o posicionamento de suas mensagens ou lições. Por exemplo, um designer instrucional pode usar palavras sobre fissão nuclear que são muito técnicas por natureza , e apresentá-lo em um tom mais coloquial dentro da sala de aula para alunos do primeiro ano, pedindo à AI que ajuste o palavreado ou o tom para atender às necessidades e níveis dos alunos.
Além disso, de uma perspectiva de treinamento corporativo, os modelos de IA podem até ser solicitados a adotar conceitos importantes, como diversidade no local de trabalho, e enquadrar esses conceitos em um nível executivo ou de nova contratação para criar um currículo ou perguntas de questionário que alimentem os resultados do aprendizado que está sendo criado.
O Mark Booker disse que: “Usar a IA dessa maneira pode ajudar a economizar tempo com a criação de materiais de aprendizado mais personalizados e permitir que os designers instrucionais façam mais com seu conteúdo para atender a diferentes partes e suas necessidades de aprendizado. Até agora, nossa experiência usando IA no desenvolvimento de currículo tem sido mais semelhante a ter outro parceiro para revisar seu trabalho, para dar sugestões ou ideias diferentes para ponderar, em vez de substituir o capital humano."
Esse é o ponto: lembra do episódio do Metanoia Lab número 144, onde falei do impacto da IA sobre educação em geral, através de uma fala do Sal Khan? Fundamentalmente a IA não vai substituir os educadores e professores, mas vai complementar o trabalho deles e ajudar o aluno, sendo meio que um tutor personalizado. Pois bem: é disso que estamos falando, uma tecnologia que nos apoia no processo de aprendizagem corporativa, e não substitui os palestrantes e educadores. Apenas complementa o trabalho deles, ajudando a ter mais granularidade e volume de conteúdo, e depois num algoritmo de recomendação estilo Netflix. Só assim, poderemos aproveitar a enorme oportunidade de transformação que a IA está trazendo para o mundo da educação corporativa.
